"Marcio é maravilhoso

Marcio é divino

Marcio é moço fino

Rufino é homem com olhar de menino

Marcio é decidido

Marcio é mestre, brilha no ensino

Marcio é guerreiro...

E nesse Emaranhado Rufiniano, quero me emaranhar."

(Camila Senna)















quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Aquiles e o estranho bombom




Já era meio dia quando Aquiles resolveu ir ao banco. Como era meado de mês, com certeza, não iria encontrá-lo cheio. Ao andar até o centro de Belford Roxo a pé, sentia que o tempo era de um nublado opressor. O sol era um espectro agonizante por trás das cortinas de nuvens com suas nervuras negras e cinzas. Havia chovido dias antes, mas parecia que a chuva aumentava ainda mais o calor. Ao chegar no caixa-eletrônico sacou tudo que tinha: dez reais. Daria para caminhar até o bairro de Areia Branca onde morava, e comprar uma quentinha de cinco reais para almoçar - e ainda sobrava. A mãe havia morrido fazia quatro anos; o pai contraiu novas núpcias fazia dois; a irmã havia se casado fazia um e meio. Ficou então, ele sozinho naquela casa de dois andares. Não; a solidão não lhe doía, pelo menos por enquanto, pois tinha a companhia de seus livros, de seus cds, de seus sonhos e de sua angustia de quem já passou dos quarenta e ainda não se deu conta disso.

Foi quando de repente, se viu diante de uma galeria onde havia uma charmosa bomboniere. Lembrou de quando assistiu ao filme "A Fantástica Fábrica de Chocolates" na televisão e sentiu falta do tempo em que acreditava em Universos Paralelos; do tempo em que esses Universos eram apenas doces; ou melhor quando achava que só o doce era interessante. Do tempo em que não tinha descoberto que o salgado e o azedo podiam ser muito instigantes. Ou melhor. Sentiu saudade do tempo em que ainda não tinha descoberto o instigante que era o tempo da inocência.

Já dentro da bomboniere observou os vários sabores, quando deparou com um que surpreendeu-o: goiaba com café. Ao lê-lo na embalagem, a primeira imagem que veio na mente de Aquiles foi a da goiabeira do quintal da casa de sua avó paterna; como gostava de subir nela com os primos e coleguinhas de infância. Gostava mais das goiabas brancas. Comia-as com casca, caroço e tudo. Lembrou da dó que sentiu ao ver a goiabeira ser arrancada para construir a meia-água que iriam alugar e depois vender após a morte da avó. Achou tudo muito esquisito. Como podia haver essa mistura? Tanto a goiaba quanto o café lhe acolhiam bem nas lembranças de infância. O café era o primeiro cheiro que sentia; tirado do fogo do fogão; quentinho direto para o coador de pano, antes de ir para escola. Sua mãe sempre servia-o forte. Preto e forte. Comprou apenas um bombom. E apesar de não conseguir encontrar nenhuma conexão gustativa pela sinapse dos sentidos e da memória que lhe causasse uma sensação de prazer ou de asco, desembrulhou e mordeu o bombom. Ao mordê-lo a primeira sensação que teve de ter uma floresta negra preenchendo sua boca e seu estômago deu-lhe a impressão de que nunca sentiria fome na vida. Logo depois o sabor frio da calda de goiaba com café e sua simplicidade dúbia lhe transportou como uma máquina do tempo comestível para dentro de si mesmo.

Era incrível como o estranho sabor do recheio do bombom lhe despertava lembranças marcantes, intensas, dolorosas, surpreendentes. Viu a primeira imagem que o excitou na vida quando tinha doze anos. Era de uma capa de revista erótica exposta em uma banca de jornal: um jovem beijava uma bunda branca, lisa, tenra, macia. Saiu apertando o passo pela rua Benjamin Pinto Dias. Mordeu novamente o bombom e desta vez a floresta negra veio seguida da dificuldade de se entender e entender o mundo na infância. Era negro, gordinho e desajeitado. Os pais com muito sacrifício matricularam-no  numa escola particular. O pai era um bancário; a mãe uma ex-enfermeira que abdicou da profissão para cuidar melhor dele. Na escola, os meninos brancos maiores, duas turmas mais adiantados achincalhavam-no e quando ele finalmente reagia, o inspetor que até então assistia tudo imóvel, fazia questão de botá-lo de castigo em pé durante horas em baixo do sol quente. O bombom lhe descia seco na garganta e a calda de goiaba com café descia-lhe frio e indiferente entre os dentes até a gengiva.

Estava atravessando a rua da padaria quando deu a terceira mordida. Se lembrou dos treze anos; de sua mãe espancando-o com o salto fino do tamanco, abrindo-lhe um enorme galo na testa- gritando enlouquecida que se ele fosse veado o mataria e depois se mataria. Lembrou da primeira vez que se masturbou na vida pensando no galã da novela das oito. A quarta mordida lhe trouxe a primeira cantada que recebeu do vizinho solteirão aos 18 anos e, apesar do desejo ser recíproco, a fuga na certeza de que aquele desejo era  passageiro e logo ele seria um homem "normal" como qualquer outro. A quarta mordida veio com a primeira transa na última fileira da poltrona de um ônibus de excursão com um colega de trabalho na volta de um passeio de sábado nas montanhas e a sensação de a ficha estar caindo e não ter mais para onde correr.

Já estava no centro de Areia Branca quando deu a penúltima mordida e se lembrou de quando falou de sua intimidade com sua mãe depois de tantas cobranças e interrogações. De um caindo chorando para um lado e o outro caindo chorando para o outro. Nesse momento o sol se abria e com ele a chuva caia; e Aquiles diante da pensão pegava a sacola de quentinha.

Quando chegou na esquina de sua casa olhou para o horizonte e um enorme arco-íris se exibia imponente por trás da escola que ficava no outro lado da rua; com a chuva metralhando seu óculos. Foi quando deu com o derradeiro pedaço de bombom a boca: e com ele veio a lembrança de quando se entregou finalmente ao vizinho solteirão vinte anos depois da primeira cantada e do momento em que faziam amor enquanto ele sussurrava em seu ouvido o quanto o desejava desde quando era menino.

O ar agora estava fresco e Aquiles já na calçada de casa, lambia o que restava do bombom na embalagem. Jogou-a na poça d'água e olhou para trás, vendo o papel do bombom de goiaba com café navegando rumo ao boeiro; como um barquinho que levava em sua embarcação todas aquelas lembranças para o precipício.

Quando abriu a porta da sala, admirou a sujeira e a bagunça; e falou para si mesmo com a sacola de quentinha na mão:

- Hoje essa casa não escapa de uma boa faxina!

Marcio Rufino
Conto inspirado na provocação "goiaba com café" feita por Ivone Landim no sarau Catando Contos.






quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Desinibido



Agora que estou sozinho
Vou andar nu pela casa
E me masturbando
Para com meu sêmen
Fertilizar o chão empoeirado
Do banheiro e da sala.
Não vou limpar a casa,
Pois a poeira, filha do tempo
Foi minha companheira;
Testemunha do meu sonho 
E desespero.
Foda-se que a vizinha
Do terraço da frente veja.
Ela que também se masturbe
Com o primeiro gargalo
De garrafa de cerveja
Que estiver na sua frente,
Pois minha casa virou
Meu templo, meu mundo
Onde agora sou deus
De sentimentos rasos
Ao mesmo tempo profundos;
Onde a canção de pano de fundo
É o canto agridoce e melancólico
De um querubim 
Surdo e mudo.

Marcio Rufino
Imagem: Google images

sábado, 26 de julho de 2014

Posfácio do poeta Tanussi Cardoso para o livro Emaranhado




BELEZA E ESTRANHEZA EM MARCIO RUFINO – A QUESTÃO DO “SER”
Tanussi Cardoso

I-                   INTRODUÇÃO

Estranha e bela a poesia de Marcio Rufino. Há nela certa dualidade, em relação ao que chamamos vazio da realidade, como se, ao mesmo tempo, o poeta (ou seu personagem? já que estamos falando, também, de alguém que vive o mundo do teatro...) tivesse em sua dimensão a certeza de que se está só, mas, igualmente, a sensação de que não se está só.   Essa solidão – qualquer que seja, e venha de onde for – sintetiza a expressão íntima da busca do prazer – seja que nome dar a esse prazer. Pelo que depreendemos dos versos de Rufino, se vivemos no caos (social, político, emocional), prazer, dor e terror viram argamassas idênticas entre si. E as dores humanas são as mesmas desde o início dos Tempos. Não à toa, o verso que abre o volume afirma: “... pois eu sei que só digo coisas que já foram ditas / e só escrevo coisas que já foram escritas.” (“Louco currículo”), porque sabe, com inteligência, que o novo é o velho reescrito.
O título deste segundo livro do autor faz todo o sentido: “EMARANHADO”, onde muitas ideias se misturam, e onde se confundem as antíteses entre paixão e desamor; erotismo e culpa; corpo e alma; Deus, deuses, semideuses; religião e paganismo; além de certa dubiedade sexual. Temas que se embaraçam, de maneira quase kafkiana, envolvendo a quem o lê num enredo difuso de angústia, de nó cerebral e sentimental. De fricção. Um texto quase teatral, em sua forma e em sua técnica. Portanto, muito feliz a escolha da epígrafe de Fernando Pessoa que abre o livro: “Ó universo, novelo emaranhado, / Que paciência de dedos de quem pensa / Em outra cousa te põe separado?”
Tal “estranhamento” vem desse labirinto, dessa teia que envolve o tecido poético, cercado de mitos, onde filosofia, religião, zoologia, sociologia e, mesmo, amores se interligam, se interpenetram, em todo o espaço onde houver lugar para o ato de se viver, de sentir-se vivo. Afinal... ”lá fora é aqui dentro.” (“O morro, a igreja e as crianças”).

II-                O LÍRICO

Ainda que lírico (palavra surgida no Romantismo do século XIX, voltada ao subjetivo, ao emocional e ao individual - à marca do “Eu”), Rufino nos oferece um texto nada suave. Seus poemas ferem fundo, incomodam, não pedem o conforto dos olhos do leitor. Metáforas e metonímias em profusão trabalham versos de não fácil desconstrução. Sua palavra é viva, arde, queima. Um grito que ecoa forte, cerzido da ancestral dor humana.
Entre os gregos, a lírica se vinculava, basicamente, às religiões. Os textos de Marcio Rufino se equilibram na tênue linha entre a obscuridade e a transparência, com imagens recorrentes da coisa divina, do sincretismo, com o ritual do que é pagão e religioso, que, ininterruptamente, nos direcionam ao caminho da solidão, dos amores, quase sempre perdidos, e à culpa, social e íntima. Há um sentimento do sagrado, de influência dogmática, com tudo que há de punição e vergonha, muitas vezes. Como se estivesse, permanentemente, “num estado mental próximo ao da prece”, para lembrar Matisse.
Poemas difíceis, muitas vezes cifrados, talvez para serem lidos através de seus avessos, ressignificando seus conteúdos, unidos por pensamentos que se entrelaçam como estilhaços em fogo, isto é, em alta voltagem poética: “Sobre pelos que se transformam em horto.” (“As montanhas de carne”); “Há rios vermelhos de groselha e de sangue.” (“Negro Éden”).
Como se houvesse um bicho dentro dele, que precisasse amansar, mas que não conseguisse perceber qual bicho seria, apesar de tentar, através do poema, tocá-lo, senti-lo, fazer-se “amigo”. Domá-lo: “Talvez eu encontre uma hora livre / Para ser o que eu quero e fugir do mundo / Para me refugiar de tudo que me corrige / Até mesmo de um falso ensejo profundo./ (...) Para me livrar da culpa de algum pecado / Que minha consciência quer e exige / Até de um delito que eu não tenha sonhado. / Talvez eu vire um semideus sensual / Que remova céus e montanhas / Em busca de uma alternativa natural / De lidar com minhas forças estranhas.” (“A hora livre”).
Rufino deseja se expressar, sobretudo, sobre o absurdo da possibilidade de se estar vivo nos dias de hoje, formando digressões verbais e ideológicas motivadas pela memória que se perde no “emaranhado” das coisas presentes e na impossibilidade do futuro. O poeta se espanta com as singularidades entre a fantasia, a imaginação e o real, que, afinal, formam “nós mesmos.” (“Ficções”). E vê surgir um ser de grande fragilidade e carência, cuja imagem que faz de si radicaliza-se poeticamente no bojo de sua fértil imaginação.

III-             CULPA, PECADO, SEXO, AMOR E POESIA

Quase todos os temas caros ao autor (culpa, pecado, redenção, pureza, salvação) encontram-se, de forma explícita, no poema em prosa “O despertar de Adão”, onde se “mesclam” a figura de Adão com o Eu (personagem?) do poeta. Vejamos alguns fragmentos:
“Outro dia ao acordar, imaginei-me no lugar de Adão. Mas não o Adão de Eva; não o Adão da árvore do fruto da ciência do bem e do mal; não o Adão da expulsão do Paraíso; não o Adão que gerou Caim e Abel. Mas o Adão de seu princípio. (...) E sendo ele seu próprio início, ainda sofria e se espantava com seu próprio desconhecimento de si e de tudo que lhe rodeava. (...) Eu era um Adão-Frankstein que desconhecia a mim e ao mundo e sendo me dado de presente, não sabia o que fazer com aquilo tudo.”
Mas, o que Marcio Rufino almeja é entregar-se ao Mistério, amorosamente, e deixar-se falar com ele sobre dúvidas, mais do que certezas. Nessa poesia fremente, profunda, visual, imagética, quase sempre interrogativa ou reticente, a ponto de, em alguns poemas, negar-se aos fluxos internos de seu corpo e, óbvio, de seu desejo, há um imenso teor erótico pairando latente na pele de seus versos. “Emaranhado” é uma viagem entre a angústia e o erotismo de um poeta que sabe temperar temas difíceis com o azeite do bom texto. O que nos pode remeter a Max Stirner, um dos geradores do anarquismo: “Se nos buscamos, isso significa que ainda não nos temos, andamos atrás daquilo que devemos ser, logo não o somos. Vive-se na nostalgia e assim se viveu durante milênios, na esperança. Muito diferente é viver... no gozo!...”
Em seus poemas, há uma sensualidade e uma sexualidade quase reprimidas, mas latentes e pulsantes: “Conforme nossos atos, podemos ser na vida animais ou vermes. / Mas sempre estamos atrás de algo que se reproduza (...) Eu me perdia sem medo nas matas negras do seu corpo / E descobria que seu coração morava dentro do seu falo.(...) Mas meu sonho é nós nos entendermos sem compromisso / Botarmos para fora todo desejo reprimida mente omisso.” (“Indócil idílio”).
O teor erótico, carnal, lúbrico e libidinoso, de alguns poemas, pode ser interpretado como a dor da não-aceitação (pessoal? social?), e, por isso, falam mais ao coração que à razão. Vejamos o que digo, já a partir do título de um dos poemas, “O amor anormal”: “Sentir o proibido não é nada / Pior é aceitar o proibido/ Num rumo qualquer de estrada / Ou na dolorosa manha da libido. (...) Não é nada atender o desejo do outro / Pior é fazer com que esse desejo seja também seu / E ver dentro da lama do outro o ouro (...) Entregar-se a perversão passiva / É muito fácil como cômoda intolerância (...) O outro também quer me dominar (...) Com frieza e crueldade quer me usar / Sem saber que também será vilipendiado por mim. (...) Ele quer sentir o odor de seu sêmen em minha boca / Mas isso são sonhos imundos que povoam minha cama de casal. (...) O outro sou eu num idílio híbrido / O outro somos nós num dilacerado momento / Que desenha o amor anormal e ilícito (...) Esse amor que por se ousar existir / Subvive a margem do planeta (...) Não sei o porquê de todo esse desprezo. Se tudo que aí está é amor / Queria falar de todo o meu desejo / Sem causar deboche, nem horror. (...) Dedico esse texto a memória de Clarice / E continuo sufocando a minha agressividade / Pois a anormalidade me disse / Que o amor e a arte é que salvarão a humanidade.”
Ou ainda, em “O monstro Teimosia”: Teimosia inexorável, soberba, sonhadora. / De gosto louco, bêbado, exótico. / Conivente com outros monstros depravados / Que se acariciam / Em frente à gigantesca tela plana de cinema erótico.”
Por paradoxal que se mostrem alguns termos e ideias, nos poemas acima citados, de qualquer forma, são libelos corajosos. Apesar da sexualidade e da sensualidade encantatórias, o desejo vem sempre encoberto e assombrado pelo social e pelo religioso. À sombra.
Por outro lado, num ousado grito de liberdade extremado, discorre: “Você ainda não conhece os versos / que nascem na calada da madrugada fria / embaixo do cobertor. (...) pois somente nos meus versos / posso, quero e devo fazer amor, / não só com mulheres e homens, / mas também com crianças, bichos, / plantas, coisas, anjos, santos / e Deus muito além das orações. / Você não sabe que meus versos (...) acabam saqueando corações e almas / e não conseguem saquear corpos. (...) mas meus versos, mesmo assim, / sentem inveja dos versos que saqueiam corpos.” (“Você não conhece todos os meus versos”).
E é o próprio poeta quem nos afirma, em seu poema “Ancestralidade”: “Minha idade adulta cria um paradoxo / Entre o que eu não vivi e gostaria de ter vivido; / Entre o que eu vivo e não gostaria de viver; / Entre o que eu poderia ter sido e não fui; / Entre o que eu sou e gostaria de ser.”
Essa “desorientada pessoa” (“Uma retórica apaixonada”), esse desespero, essa angústia, essa luta interna do poeta, entre o ser, o querer e o estar, nos induz a pensar que estamos aqui para observar o caos que nos fincou no mundo, e imaginar o que fazer dele ou com ele. Hilda Hilst já dizia que “a literatura vem desse conflito entre a ordem que você quer e a desordem que você tem”; assim, ao poeta cabe erigir essa poesia que o mantém vivo e, quem sabe, dar um viva à desordem que, ao mesmo tempo que o contém, o edifica. Só lhe resta organizar o caos e compreender a loucura e o sentido da liberdade. Afinal, “ser livre é suportar a angústia de cada escolha”, citando, aleatoriamente, Sartre.  Para Rufino, o que está em jogo é o Mistério da própria Vida: “A vida é uma ilha flutuante / Sem porto fixo, sem norte./ Quanto mais se nada em sua direção / Mais ela foge. (“O monstro Teimosia”). Ele sabe (ou intui) que o poeta faz poesia para se sentir vivo, para aprender a viver.

IV-             (IN) CONCLUSÃO

Entre imagens surrealistas e criativas, Marcio Rufino constrói um poema instigante e versátil; um painel de imagens míticas e místicas, onde sobram dor e melancolia, mas, onde, igualmente, tange a luta entre o passado, o presente e o impensável futuro, onde cavalga certa desesperança no mundo dos homens: “Se alguém perguntar / Quem eu sou / Diga que sou uma criatura quase humana / Algo entre religioso e monstruoso... (...) Algo que não fosse nem pergunta nem resposta (...) Se alguém perguntar / Onde moro / Diga que por aí / Chegando de repente / Sem hora pra partir. (“Identidade”).
Na poesia de Rufino, tudo é diferente e uno; um “emaranhar-se” de possibilidades e caminhos. Nela, cabe tudo e todos, em especial, os considerados “fora-da-ordem”: anjos, mosquitos bêbados, fadas, lobisomens, cisnes com flores no rabo, Mães D´água, cravos nus, homens-peixe, bruxos, montanhas de carne, Serafins, reis, princesas, magos, piratas, imperadores, monstros, duendes, ninfas dos bosques, demônios, grilos, borboletas, pombos negros, urubus, emas, chifres brancos de capeta, sete mil pragas do Egito, camponeses, elefantes de louça, pernilongos... O que o poeta deseja mesmo é “Ser um mosaico de naturezas, pensamentos e quimeras, / Onde tudo avassaladoramente se completa.” (“Uma retórica apaixonada”).  
            “EMARANHADO”, belíssimo livro do poeta Marcio Rufino, com seus textos dilacerantes, em verso ou em prosa, nos retrata um mundo onde a dor ecoa, onde se é só, onde a tristeza nos dá o pão de cada dia. É um trabalho desiludido, no qual o humor não serve de amparo. Rufino nos incita a pensar sobre o mundo, sobre nossas vidas, nesses tempos de homens e amores frios e terríveis. “O que fazer”?, parece perguntar o poeta. E parece nos responder: “Só a poesia é o lenitivo capaz”.


Tanussi Cardoso é poeta

quinta-feira, 5 de junho de 2014

Lançamento de Emaranhado no CCDonana







16 anos depois de ter lançado meu primeiro livro de poesias Doces Versos da Paixão, tive a honra de lançar no Centro Cultural Donana, onde apresento o Sarau Donana junto do coletivo Pó de Poesia, neste último sábado de 31 de maio de 2014, meu segundo livro Emaranhado pela editora Maple. A noite foi um sucesso e recebemos artistas e intelectuais de todo o Rio de Janeiro. O livro de tem prefácio de Ivone Landim e já está a venda no site da editora.

quarta-feira, 19 de março de 2014

Quebradas contam Abdias













Na noite do dia 14 de março foi apresentada dentro da programação da festa em comemoração ao Centenário de Abdias Nascimento (1914-2011) no Centro Cultural da Ação da Cidadania a performance teatral Quebradas contam Abdias, criação coletiva do Coletivo de Artes das Quebradas da Universidade das Quebradas.

Ator, escritor, artista plástico e ativista político, Abdias criou nos anos 1940 o TEN (Teatro Experimental do Negro), importante companhia de teatro que montava espetáculos de temáticas que valorizavam a cultura afro-brasileira e que lançou grandes atores e atrizes como Ruth de Souza e Léa Garcia. Abdias foi um grande defensor e difusor da cultura negro-africana.

O evento foi produzido pelo IPEAFRO que tem a curadoria de Eliza Larkin, viúva do grande mestre.

Quebradas contam Abdias

Criação coletiva do Coletivo Artes das Quebradas

Elenco por ordem de entrada:

João Griot (Exú/Abdias jovem); Nelson Crisóstomo (Griot); Marcio Rufino (Abdias Nascimento); Tetsuo TEkita (povo); Edmar Júnior (povo); Noélia Albuquerque (povo/yabá) Tica Fernandes (povo/yabá); Emanoel Crisóstomo (Abdias menino); Valéria Barbosa (yabá); Eliete Miranda (Oxum).